quinta-feira, 12 de agosto de 2010

O lugar da cura na pregação

Por Alan Capriles

Há poucos dias, enquanto eu lecionava homilética, fui confrontado por um de meus alunos com a seguinte pergunta:

- É errado pregar sobre cura?

Respirei fundo, tentando encontrar uma resposta sábia, que não viesse diluir a turma. Afinal de contas, ali estavam membros de denominações muito maiores que a minha, como irmãos da Nova Vida, da Assembléia de Deus e, para surpresa minha, até da Mundial do Poder de Deus. Mas, para uma pergunta simples e direta, nada melhor que uma resposta franca e objetiva:

- Sim, é errado pregar sobre cura.

A reação foi imediata. Enquanto uns cochichavam, outros se contorciam e alguns pareciam não acreditar na minha resposta. Entre os alunos, haviam membros da minha igreja que já haviam testemunhado pregações minhas sobre cura divina. Mas isso foi há anos... A verdade é que não prego mais sobre cura. E tenho fortes razões para ter eliminado este tipo de mensagem. Razões bíblicas, irrefutáveis.

A primeira razão é porque não há nenhum registro bíblico de que se deva pregar assim. Nenhum. Se examinarmos as pregações do Novo Testamento, iremos constatar que nem os discípulos, nem os apóstolos e nem mesmo o próprio Senhor Jesus pregava sobre cura. Eles pregavam o evangelho do Reino. A cura podia vir depois, como sinal de que Deus era com eles. Em outras palavras, os apóstolos não ficavam pregando sobre cura. Eles curavam, em nome de Jesus, e para glória de Deus.

Ao invés disso, muito se prega hoje sobre cura, mas poucos são realmente curados. Não me refiro a desaparecer uma dor de cabeça, ou de coluna. Hipnotizadores também conseguem eliminar dores de uma platéia, por sugestão. Refiro-me a cegos enxergarem, paralíticos andarem e outros grandes sinais, semelhantes a estes. Sei que Deus ainda pode restaurar a visão de um cego e levantar paralíticos. Deus é soberano, e seu poder, infinito. Mas não é este o ponto. A questão crucial é que o fato de Deus curar não nos autoriza pregar sobre cura. As próprias Escrituras me convenceram de que não.

Vejamos o melhor dos exemplos: Paulo. Sabemos que nenhum outro apóstolo foi tão usado por Deus para curar como ele. No entanto, Paulo não pregava sobre cura. Ele curava, o que é muito diferente. O texto a seguir é um bom exemplo:

[Paulo e Barnabé] "fugiram para Listra e Derbe, cidades da Licaônia, e para a província circunvizinha; e ali pregavam o evangelho. E estava assentado em Listra certo varão leso dos pés, coxo desde o seu nascimento, o qual nunca tinha andado. Este ouviu falar Paulo, que, fixando nele os olhos e vendo que tinha fé para ser curado, disse em voz alta: Levanta-te direito sobre teus pés. E ele saltou e andou." (Atos 14:6-10)

Como se percebe, Paulo não pregava sobre cura. Ele pregava o evangelho. O problema é que muitos pregadores nem sequer sabem definir o que é o evangelho! E alguns pensam que pregar o evangelho é apresentar um Jesus curandeiro.

A segunda razão pela qual não devemos pregar sobre cura é porque nem todos os ouvintes tem fé para serem curados. Ainda meditando no referido texto de Atos, vemos que Paulo curou o coxo porque percebeu que este "tinha fé para ser curado". O próprio Senhor Jesus, quando esteve em Nazaré, “não pôde fazer ali nenhum milagre, senão curar uns poucos enfermos, impondo-lhes as mãos.” (Marcos 6:5 RA) E “admirou-se da incredulidade deles. Contudo, percorria as aldeias circunvizinhas, a ensinar.” (Marcos 6:6 RA)

E, finalmente, a terceira razão que encontro para não pregar sobre cura é a mais simples de todas: Jesus nos mandou pregar o evangelho (Mc 16:15). E a boa nova do evangelho não é que Jesus nos cura, mas que ele nos salva de nossos pecados. “E esta é a promessa que ele nos fez: a vida eterna.” (1 João 2:25 RC) Ele não prometeu nos curar, mas nos reconciliar com Deus por meio do seu sangue, livrando-nos da ira que brevemente virá (Rm 5:9; Ef 1:7; Cl 1:4)

Apresentar Jesus como curandeiro é rebaixá-lo ao mesmo nível das entidades que atuam no baixo espiritismo, ou das imagens do catolicismo. Supostos milagres podem acontecer em qualquer lugar e crença, sem que Jesus tenha nada a ver com isso! (Mt 7:22,23; 24:24)

Pregar a Jesus como curandeiro também acaba por atrair as pessoas por motivos errados. Ao invés de buscarem a Cristo arrependidas de seus pecados e dispostas a se converterem a ele para serem filhas de Deus, como nos ensina o evangelho, as pessoas lotam os cultos esperando por algum benefício, como se o culto fosse para elas. E temo que a maioria das igrejas estejam cheias disso... de bodes e não de ovelhas.

Precisamos voltar a crer na eficácia da pregação do evangelho. Não de um evangelho de milagres, centrado no homem, que apresenta Jesus como a solução. Não há base bíblica para este falso evangelho. Nenhum discípulo ou apóstolo pregava assim!

Precisamos reler o Novo Testamento a fim de resgatarmos o evangelho bíblico, genuíno, que apresenta Jesus como a salvação. E confiar na atuação do Espírito Santo, que convence cada homem de seu “pecado, e da justiça, e do juízo:” (João 16:8 RC) Na pregação do verdadeiro evangelho está o poder de Deus para salvação de todo aquele que crê.

Quanto aos meus queridos alunos de homilética, eles entenderam que continuo crendo no poder de Deus para curar, mas que, biblicamente falando, não há lugar para a cura na pregação. Diante deste fato, precisaram tomar uma decisão: pregar segundo o modelo bíblico, centrado em Cristo, ou pregar segundo o modelo neo-pentecostal, centrado no homem. Um é contrário ao outro. Para mim, não é uma decisão difícil. E para você?


Fonte: Blog do Alan Capriles
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