quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Por que alguns acham a Bíblia difícil?

Ninguém pode negar que algumas pessoas acham a Bíblia difí­cil. Os testemunhos quanto às dificuldades encontradas na leitura bíblica são inúmeros e não podem ser desconsiderados levianamente.

Na experiência humana existe geralmente um complexo de mo­tivos e não um só motivo para tudo, o mesmo acontece com as di­ficuldades que encontramos na Bíblia. Não se pode dar uma res­posta instantânea para a pergunta: Por que a Bíblia é difícil de en­tender? Qualquer resposta irrefletida tem toda probabilidade de es­tar errada. O problema não é singular, mas plural, e por esta razão o esforço de encontrar para ele uma solução única será frustrado.

Apesar desse raciocínio, ouso dar uma resposta curta para a pergunta, e embora esta não responda a tudo, contém boa parte da solução do problema envolvido numa questão assim complexa. Acre­dito que achamos a Bíblia difícil porque tentamos lê-la como tería­mos qualquer outro livro, mas ela não se assemelha a nenhum outro livro.

A Bíblia não é dirigida a qualquer um. sua mensagem tem como alvo alguns escolhidos. Quer esses poucos sejam escolhidos por Deus num ato soberano de eleição ou por corresponderem a determinadas qualificações, deixo para cada um decidir como possa, sabendo perfeitamente que sua decisão será determinada pelas suas crenças bá­sicas sobre assuntos tais como predestinação, livre-arbítrio, os de­cretos eternos e outras doutrinas relativas. Mas o que quer que tenha tido lugar na eternidade, o que acontece no tempo fica evidente: alguns crêem e outros não; alguns são moralmente receptivos e ou­tros não; alguns têm capacidade espiritual e outros não. São para os primeiros que a Bíblia foi escrita, os demais irão lê-la inutilmente.

Sei que alguns leitores vão apresentar objeções vigorosas neste ponto, e as razões para elas são fáceis de descobrir. O cristianismo de hoje se concentra no homem e não em Deus. O Senhor precisa aguardar com toda paciência e até mesmo respeito, sujeitando-se aos caprichos humanos. A imagem de Deus aceita pelo povo é a de um Pai aflito, esforçando-se em desespero amargurado para fazer com que as pessoas aceitem um Salvador de que elas não sentem neces­sidade e em quem têm pouco interesse. A fim de persuadir essas almas auto-suficientes a responderem às suas ofertas generosas, Deus fará quase tudo, usando até mesmo métodos de venda especiais e lhes falando da maneira mais íntima possível. Este ponto de vista é, naturalmente, um tipo de religião romantizada que consegue fazer do homem a estrela do espetáculo, embora usando com freqüência termos elogiosos e até mesmo embaraçosos em relação a Deus.

A idéia de que a Bíblia e dirigida a todos criou confusão den­tro e fora da igreja. O esforço de aplicar os ensinamentos contidos no Sermão do Monte às nações não-regeneradas do mundo é um exemplo disto. Os tribunais e poderes militares da terra são insta­dos a seguirem os ensinos de Cristo, algo evidentemente inviável para eles. Citar as palavras de Cristo como diretriz para policiais, juizes e militares é interpretar absolutamente errado essas palavras e revelar completa falta de compreensão dos propósitos da revela­ção divina. O convite gracioso de Cristo é estendido aos filhos da graça e não às nações gentias cujos símbolos são o leão, a águia, o dragão e o urso.

Deus não só dirige suas palavras de verdade aos que têm ca­pacidade para recebê-las, como também as oculta aos demais. O pregador faz uso de histórias para esclarecer a verdade, nosso Senhor usou-as muitas vezes para ocultá-la. As parábolas de Cristo foram o exato oposto da moderna “ilustração” que serve para esclarecer; as parábolas eram “ditos obscuros” e Cristo afirmou que fazia uso delas algumas vezes a fim de que seus discípulos pudessem compreender, mas não os inimigos. (Veja Mateus 13:10-17.) Assim co­mo a coluna de fogo iluminava Israel, mas servia para ocultá-los aos olhos dos egípcios, as palavras do Senhor brilham no coração do seu povo embora deixem o incrédulo presunçoso nas trevas da noite moral.

O poder salvador da Palavra fica reservado para aqueles a quem ele se destina. O segredo do Senhor está com aqueles que O temem. O coração impenitente não descobrirá na Bíblia senão um esqueleto de fatos sem carne, vida, ou fôlego de vida. Shakespeare pode ser apreciado sem necessidade de arrependimento; podemos entender Pla­tão sem acreditar numa palavra que ele diz; mas a penitência e a humildade juntamente com a fé e a obediência são necessárias a fim de que as Escrituras possam ser compreendidas corretamente.

Nos assuntos naturais, a fé segue-se à evidência, sendo impos­sível sem ela, mas no reino do espírito, ela precede o entendimento; e não se segue a ele. O homem natural precisa saber a fim de acre­ditar; o homem espiritual precisa crer para vir a conhecer. A fé que salva não é uma conclusão extraída da evidência; mas uma coi­sa moral, uma coisa do espírito, uma infusão sobrenatural de con­fiança em Jesus Cristo, um perfeito dom de Deus.

A fé salvadora se baseia na Pessoa de Cristo; ela leva imedia­tamente a uma rendição do nosso ser total a Cristo, cujo ato é impos­sível ao homem natural. Crer corretamente é um milagre compa­rável ao da ressurreição de Lázaro sob a ordem de Cristo.

A Bíblia é um livro sobrenatural e só pode ser entendido com ajuda sobrenatural.




Fonte: livro “O Melhor de A. W. Tozer”
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