O interesse espiritual não afasta o vínculo de emprego. Com esse fundamento, a Justiça do Trabalho de Minas Gerais reconheceu o vínculo empregatício entre um cantor de música evangélica e a Igreja Pentecostal Deus é Amor. A igreja também foi condenada a pagar indenização de R$ 280 mil ao cantor por violação de direito autoral. Ele gravou um CD para a instituição, na qual trabalhava e fazia shows.
“Ficou claro nos autos que o autor, como cantor religioso, não prestava serviços em prol da comunidade religiosa, de cunho espiritual, tão somente, mas sim em proveito da pessoa jurídica da Igreja, para a qual empregava, sim, seus dons sacerdotais para a evangelização dos fiéis, mas com caráter oneroso, já que essa auferia lucros, em cifras consideráveis, com a venda dos CD`s por ele gravados”, afirmou o juiz Marcelo Vidal, da 10ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte.
De acordo com a decisão, ao assinar o contrato de gravação do CD, o cantor foi obrigado a transferir seus direitos autorais à igreja, tendo recebido R$ 10 mil pelo acordo, contrato considerado ilegal pela Justiça. “A ilegalidade do ato não consiste pura e simples na assinatura de um contrato de cessão e transferência de direitos autorais (até mesmo porque tal possibilidade é prevista na legislação que regula a matéria, Lei 9.610/1998, em seu artigo 49), mas sim na comprovação de que os cantores na Igreja ré o são obrigados a fazê-lo”, disse o juiz.
Segundo o cantor, foram vendidas mais de 90 mil cópias do CD, comercializados a R$ 18. Já a Deus é Amor afirma que foram 36 mil cópias, a R$ 15. Diante da dificuldade em se determinar a quantia exata de vendagem, o juiz considerou R$ 200 mil como "margem razoável" para o lucro devido ao músico.
O cantor trabalhou na Igreja Deus é Amor por três anos em cultos e também fazendo shows por todo o país, recebendo uma ajuda de custo de R$ 100 a R$ 200 por apresentação, num total de R$ 1 mil a R$ 2 mil por mês, segundo testemunhas. Ao reconhecer o vínculo empregatício, o juiz determinou o registro na Carteira de Trabalho entre julho de 2008 e maio de 2011, com salário de R$ 1,5 mil, na função de cantor.
O advogado Bruno Corrêa Lamis, que defende o cantor e outros músicos em situção semelhante, alerta que esse é um cenário muito comum nas igrejas evangélicas. “Cantores que se dedicam à música gospel e à igreja têm receio de buscar seus direitos na Justiça. Independente de seus deveres religiosos, o cantor tem o direito de ser remunerado pelas atividades prestadas”, afirma.
Fonte: Revista Consultor Jurídico
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