Projeto de lei tramita na Câmara Municipal. Ministério Público diz que é inconstitucional
Ambientalista há 15 anos e vereador há quatro meses, Marcell Moraes (PV) provocou polêmica ao insistir na apresentação de projeto de lei que pretende proibir o "sacrifício" de animais em cultos religiosos. Mesmo sem citar nomes, a ideia do vereador envolve as religiões afro-brasileiras, como o candomblé e a umbanda.
O promotor de justiça, Cícero Ornelas, do Grupo de Combate à Discriminação do Ministério Público da Bahia, diz que o projeto é inconstitucional e que vai à Justiça se a Câmara o aprovar.
Nesta quarta-feira, 1º, as discussões sobre o projeto ganharam as redes sociais. Em Salvador, segundo levantamento realizado pelo Centro de Estudos Afro Orientais (Ceao) em parceria com a Secretaria Municipal da Reparação (Semur) existem 1.155 templos das religiões afro-brasileiras.
Debate - A proposta foi apresentada, na Câmara, na segunda-feira, 29, e motivou um debate acalorado. Mas Marcell diz que não vai recuar. "A discussão fortalece a intenção de defender os animais. Não retiro o projeto".
Ele diz que a proposta tem recebido mais manifestações de apoio do que críticas. "Um ataca, dois apoiam". O vereador afirma que confia na aprovação do projeto. "Vereadores já sinalizaram apoio. O projeto vai passar".
Mas ainda não houve apoio público dos seus pares. As críticas é que continuam contundentes, inclusive de Ana Rita Tavares (PV), colega de partido e bancada. Para ela, a proposta é "inconsequente".
"Sou a favor da vida de todos os seres e, por isso, sou vegetariana há 17 anos", diz a vereadora. "Mas não será um projeto de lei que vai suprimir a crença das pessoas, especialmente em Salvador, onde o candomblé está ligado à vida da cidade", observa.
Para ela, opiniões devam ser respeitadas e o debate estabelecido. " Se há possibilidade de não usar animais em eventos religiosos, podemos debater essa mudança, mas jamais resolver o problema na base do embate.
O Partido Verde (PV), legenda de Marcell Moraes, divulgou nota em que diz prezar "pelo respeito a toda forma de culto religioso e espiritual, entendendo que cada um segue rituais litúrgicos compatíveis com suas crenças". O PV atribui o projeto a um "ato isolado e exclusivo do vereador, sem amparo do partido".
Combate - O vereador Silvio Humberto (PSB) define a ação do colega como um ato de arrogância. Na segunda-feira, Humberto ficou indignado por Marcell ter chamado os rituais do candomblé de "práticas arcaicas e medievais" e as oferendas de "sacrifício".
"O projeto é a porta para a intolerância religiosa, que é tudo do que não precisamos e deve ser combatida", acrescentou Humberto.
Até o vereador Alemão (PRP), que é evangélico, reagiu contra Marcell. "O vereador foi grosseiro, desrespeitoso, petulante e autossuficiente".
"No candomblé não se 'sacrifica' animais, como diz. Faz-se oferenda. Deus disse que 'dai a César o que é de César'. Não mandou que tirassem nada de César", completou Alemão.
Ligado aos povos de terreiro, Gilmar Santiago (PT) salientou que nem os evangélicos colocaram em pauta um projeto dessa natureza. "As religiões de matriz africana convergem para o candomblé", avalia.
Fabíola Mansur (PSB) cumprimentou Silvio Humberto com um beijo no rosto ao fim do seu pronunciamento contra o projeto. "É preciso respeitar as religiões e as tradições", disse.
Para Hilton Coelho (PSOL), Marcell trabalha sem domínio do assunto. "Ele ignora solenemente a importância do candomblé na cultura, na religião e na história de resistência política de Salvador", argumenta.
Fonte: Portal A Tarde
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