sábado, 1 de maio de 2010

Voto dos evangélicos pode ser determinante nas eleições

De olho num rebanho que já representa um quarto do eleitorado brasileiro, os pré-candidatos à Presidência iniciaram uma guerra de bastidores pelo apoio das igrejas evangélicas. A disputa para engajar bispos e pastores nas campanhas promete ser a mais acirrada desde a explosão do segmento religioso, na década de 1990.

À frente nas pesquisas de intenção de voto, José Serra (PSDB) e Dilma Rousseff (PT) investem na aproximação com as gigantes Assembleia de Deus e Universal, respectivamente.

Única evangélica na disputa, Marina Silva (PV) enfrenta dificuldade para fechar alianças formais, mas dedica parte expressiva da agenda a encontros com fiéis e líderes religiosos.

Desde outubro passado, os três concorrentes já bateram à porta do presidente da Convenção Geral da Assembleia de Deus, pastor José Wellington Bezerra da Costa. Ele lidera cerca de 10 milhões de seguidores, o equivalente à população do Rio Grande do Sul. Pouco conhecido fora dos templos, é considerado mais próximo de Serra, a quem apoiou no segundo turno de 2002.

“Serra sempre teve um canal muito forte conosco e mantém contato direto com o pastor José Wellington. Os dois conversam muito por telefone”, afirma o pastor Lélis Marinho, relator do conselho político da Assembleia e responsável por negociar com os partidos.

Apesar do flerte tucano, o líder da igreja também tem sido cortejado pelos outros concorrentes. Há seis meses, ainda como chefe da Casa Civil, Dilma participou de sua festa de 75 anos, num templo em São Paulo. Orou com os fiéis e disse, no púlpito, que o governo Lula defendia “valores cristãos”.

Fiel da Assembleia, Marina se reuniu com o conselho da igreja em março, em Brasília. Mas o fato de ser considerada um azarão deve impedir uma aliança. “Por ser da igreja, Marina seria nossa candidata de coração. Mas precisamos saber se sua candidatura foi lançada só para atender a interesses do partido”, diz Lélis. “Vamos nos definir em junho, perto das convenções [partidárias].”

Vista com reservas em setores do meio evangélico, Dilma tem recorrido à ajuda de aliados como o senador Marcelo Crivella (PRB-RJ), bispo da Igreja Universal, e o ex-governador do Rio Anthony Garotinho (PR), presbiteriano.

“Dilma tem posições pouco claras em questões sensíveis aos evangélicos, como a defesa da família e o aborto. Ela ainda precisa ser reconhecida como defensora das causas cristãs”, disse Garotinho na noite de sexta-feira, quando chegava a um encontro com evangélicos na Baixada Fluminense.

A ex-ministra busca o apoio da Convenção Nacional da Assembleia de Deus, que contabiliza 5 milhões de seguidores. Seu líder é o deputado pastor Manoel Ferreira (PR-RJ), pré-candidato ao Senado na chapa de Garotinho. Ele simboliza a volatilidade das alianças “de fé”: em 2002, quando o PSDB era governo, apoiou Serra no segundo turno. Em 2006, com o PT no poder, esteve com Lula.

Aliada do presidente em suas duas vitórias, a Universal é tida como certa na campanha de Dilma. O PRB, ligado à igreja, deve integrar a coligação. “A tendência é apoiar Dilma”, diz o presidente do partido, bispo Vitor Paulo, que divide com Crivella a função de articulador político do bispo Edir Macedo.

Para a equipe de Marina, a identificação com os evangélicos será um de seus maiores trunfos na eleição. Ela tem aproveitado as viagens da pré-campanha para encontrar pastores, orar com grupos de fiéis e dar entrevistas a emissoras de rádio e sites religiosos.

“Não temos cacife para disputar a cúpula das maiores igrejas, mas a Marina tem comunicação direta com a base cristã. Por mais que o pastor mande votar na Dilma, os fiéis vão saber quem tem fé”, alfineta o coordenador da campanha do PV, Alfredo Sirkis.

Em março, a senadora ouviu promessa de apoio de Silas Menezes, número dois da hierarquia da Igreja Presbiteriana, com 1 milhão de seguidores. O reverendo declarou que ela merecia o voto dos cristãos por ser uma “doméstica da fé”.

Segundo o Datafolha, 25% dos brasileiros são evangélicos

Os evangélicos já são 25% dos brasileiros, sendo 19% seguidores de denominações pentecostais, segundo levantamento concluído em março pelo Datafolha. Ainda não há pesquisas de intenção de voto segmentadas por religião na corrida presidencial. Em 1994, quando Fernando Henrique Cardoso (PSDB) foi eleito para o primeiro mandato, o segmento somava 14% da população. O crescimento do rebanho acompanha a redução do percentual de católicos, que hoje são 61%.

Igrejas são pragmáticas, diz analista

Apesar da unidade em temas como o veto ao aborto e à união civil de homossexuais, os evangélicos não fecham alianças eleitorais por ideologia, afirma a socióloga Maria das Dores Campos Machado, da Escola de Serviço Social da UFRJ.

“As igrejas têm alto grau de pragmatismo e veem a eleição como chance de ampliar seu poder de influência. Não há ideologia nas escolhas”, diz ela, autora do livro “Política e religião: a participação dos evangélicos nas eleições” (Editora FGV, 2006).

A pesquisadora aposta na divisão das gigantes da fé entre José Serra (PSDB) e Dilma Rousseff (PT). Vê pouca chance de apoio institucional à evangélica Marina Silva (PV), terceira colocada nas pesquisas: “Os pastores se comportam como os doadores de campanha: apostam em quem está na frente”.

Ela acredita numa aliança do ramo majoritário da Assembleia de Deus com os tucanos. “Apostar no Serra é uma forma de se contrapor ao poder político da Universal, que está com o PT”. Como a maioria dos fiéis tem baixa escolaridade, a orientação dos pastores é decisiva na escolha do voto, acrescenta a socióloga.

Fonte: Folha de São Paulo
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