segunda-feira, 21 de março de 2011

O Cristianismo nasceu em torno da mesa de refeições, afirma tradutor de grego e hebraico

O sacerdote e biblista José Tolentino Mendonça considera que as origens do cristianismo estão intimamente ligadas aos alimentos e à relação que se estabelece em torno da refeição.

Os quatro evangelhos, livros que na Bíblia narram as palavras e atos de Jesus, “são muito contados em torno da mesa” porque ela é “a estrutura comunitária por excelência em todas as culturas”, afirma o tradutor de grego e hebraico em entrevista ao programa ECCLESIA, na Rádio Antena 1, de Portugal.

“O grande símbolo cristão, a eucaristia, que começa com a última ceia, é algo que se faz em torno da mesa”, sublinha o responsável pela relação da Igreja católica portuguesa com o mundo da cultura.

Tolentino Mendonça assinala o resultado das interações estabelecidas durante a refeição: “À mesa alimentamo-nos do mesmo alimento, mas sobretudo, essa é a força dela, alimentamo-nos uns dos outros”.

As implicações da refeição na narrativa bíblica ultrapassam as questões ligadas à nutrição, tornando-se imagem de um novo sistema de relações: “Não é por acaso que a mensagem cristã se vai alojar nessa plataforma de intimidade que é a mesa”, refere o poeta nascido na Ilha da Madeira.

“É belo ver que Jesus rompe com a ritualidade estabelecida e instaura uma nova, em que os últimos serão os primeiros, em que há espaço para todos”, salienta.

O biblista lembra que “o cristianismo é a única religião em que se pode comer de tudo, com todos”, depois de Jesus ter tornado a “mesa o grande ícone do reino de Deus”.

O estilo de Jesus, “aberto” e “inclusivo”, manifestou-se também nas “suas ações e palavras”, que “não tinham uma interpretação única” e que ainda hoje continuam a suscitar questionamentos.

“Dizem-se, em todos os tempos, coisas muito diferentes sobre Jesus, porque acerca dele, e nele, refletimos as perguntas do próprio coração humano”, assinala Tolentino Mendonça.

Para o professor da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa, “Jesus é uma pergunta, mais do que uma resposta”, pelo que “nunca nada é imediato” em relação a ele. “Jesus utiliza uma linguagem que não é fechada nem de sentido único”, o que “dá à sua palavra uma riqueza enorme” e solicita uma leitura que não seja passiva.

O intérprete da Bíblia fala da “responsabilidade de apropriação” que cada leitor e ouvinte é chamado a realizar “de forma original”, ao mesmo tempo que acompanha essa reflexão com o “exercício do compromisso” e “discipulato” em relação a Jesus.

O diretor do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura destaca também a “curiosidade enorme” sobre Cristo e a forma “secular” e “laica” como ele passou do “vitral” das igrejas para as livrarias. Para o sacerdote, “a quantidade de publicações, filmes, conversas e as tentativas – muitas vezes tentações – de entrar por veredas um pouco estranhas representam o desejo de tocar Jesus”.

“Aquela imagem que os evangelistas nos dão, da multidão que se acotovelava em torno a ele para o tocar, continua a ser a situação do homem contemporâneo” diz o sacerdote.


Fonte: Agência Ecclesia, na UCB Portugal via Pavablog
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