A corrupção das pessoas está tão espalhada que faz parecer virtude uma obrigação que se cumpre, uma dívida que se paga, ou uma verdade que se diz. As coisas não se regulam pelo que deviam ser, mas pelo que poderiam ser; isto é, a dívida que se podia não pagar, e se pagou; a verdade que se disse, podendo-se esconder; e assim a privação do erro serve de virtude; e de alguma sorte, para ser um homem virtuoso, basta que não se faça algo errado. Daqui vem que uma ação é louvável só porque não é repreensível.
Apesar de parecer tão contemporâneo, o texto acima adaptado foi publicado originalmente em 1752, no livro Reflexões sobre a Vaidade dos Homens, de Matias Aires.
Fiquei impressionado como estas palavras aplicam-se tão bem aos dias atuais, onde basta não ser corrupto para ser um político merecedor no nosso voto, ou apenas cumprir o horário e não faltar no serviço para ser um bom funcionário, ou basta pagar os salários em dia para ser um bom patrão, ou não faltar às reuniões dominicais na igreja para ser considerado um cristão. Poderíamos usar diversos exemplos em nossa sociedade para perceber que temos mais méritos pelo que não somos do que pelo que efetivamente somos.
No meu ponto de vista, tal fato deve-se ao hábito de, muitas vezes, termos parâmetros rasos como referência. Ao invés de nos espelharmos nos melhores e buscarmos alcançá-los, preferimos a sensação de conforto proporcionada pela comparação com os piores.
Neste sentido, Nicolau Maquiavel, apesar da fama de mau, traz um conselho interessante em seu tratado político intitulado O Príncipe:
Um homem prudente deve sempre seguir os caminhos abertos pelos grandes homens e espelhar-se nos que foram excelentes. Mesmo não alcançando sua virtù, deve pelo menos mostrar algum indício dela e fazer como os arqueiros que, julgando muito distantes os alvos que pretendem alcançar e conhecendo bem o grau de exatidão de seu arco, orientam a mira para bem mais alto que o lugar destinado, não para atingir tal altura com a flecha, mas para poder, por meio de mira tão elevada, chegar ao objetivo.
E porque não dizer do padrão divino? No livro de Tiago, no capitulo 4:7, está escrito: Aquele, pois, que sabe fazer o bem e não o faz, comete pecado. Neste texto fica claro que, segundo a bíblia, apenas não fazer o mal não basta. É importante fazer o bem.
Temos que acabar com a lei do menor esforço, tão presente em nosso país. Onde, quando muito, faz-se o suficiente. Se você acha que estou exagerando, vá até uma repartição pública e veja como será atendido.
Diante do exposto, creio que cabe a nós refletir e avaliar qual referência devemos tomar, onde queremos chegar, que tipo de lar, empresa, igreja e país queremos ser. O ‘Melhor’ ou o ‘Menos Pior’?
Fonte: Ricardo Carreras em APD News
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