terça-feira, 1 de junho de 2010

Sensações que experimentei na igreja

“Não posso ser totalmente ingrato ao meu passado dentro da “i”greja. Tanto quanto não posso ser ingrato com meus namoricos de adolescente. Me ocorre agora uma lembrança, ou melhor lembro-me de sensações que já não sinto mais. Sensações boas, perigosas e efêmeras…

Minha vida dentro das enfeitadas construções sagradas me trouxe muita bagagem da qual me orgulho. Embora possa questionar a estrada que peguei, e aceder que existia uma melhor trilha, não mudaria o meu caminho em detrimento de onde estou. Não posso dizer que não gostaria de não ter experimentado tudo o que vivi. Não, seria hipocrisia minha…

Lembro da sensação de viver uma dicotomia. De achar que vivia o Céu no fim de semana e voltava ao mundo de Segunda à Sexta – Sábado era o esperado culto de jovens. Aquilo para mim era o Reino, era a Igreja, era a Noiva, era Deus conosco… como na música que canta o Pe. Marcelo, não sabia se a igreja subiu ou se o Céu desceu… Era a minha sensação, minha experimentação espiritual mais pungente. Provavelmente aqueles cultos repletos de contrição coletiva, choramingos, berros extravagantes e línguas era fruto do louvor que estava “fluindo”. E isso pra mim era deveras espiritual…

Eu ficava ali, na bateria, apenas observando, enquanto tocava (ou como dizia, ministrava), a igreja ceder aos nossos artífices de conduzir a massa em adoração… todos com os olhos fechados, faces enrugadas e espremidas, todos provocados pelo clima de “intimidade” com Deus. Às vezes, eu nem estava em êxtase, mas, fingia só para “induzir” a congregação. Os que não entravam no “mover”, tínhamos por menos espirituais, ou no mínimo haviam cometido algum pecado durante a semana. É claro que, muitas vezes, eu próprio havia pecado durante toda a semana, mas, no sábado eu me arrependia e orava para que Jesus me lavasse com o Seu sangue e me purificasse de todo pecado. Realmente o que fazia me confessar era a noção de “Presença” de Deus no fim de semana. Uma sensação que não experimentava durante o meio da semana e que me permitia procrastinar e pecar, confiante que Deus me perdoaria poucos minutos antes de “ministrar” louvor em “Sua Casa”…

Para mim, culto com “Presença” de Deus era culto com muito louvor, muita adoração extravagante e uma pregação tocante e, preferivelmente, com bastante eloquência e domínio das emoções dos espectadores… E, claro, se o louvor se estendesse naturalmente em resposta da congregação, ultrapassando o horário da pregação, isso era sinal de que o povo estava sedento de Deus! E se o pastor fizesse cara feia porque o louvor estendera-se era porque estava resistindo à direção do Espírito…

Aquele finalzinho de ministração de louvor, com aquela música Enche este lugar, e toda a igreja prostrada e declarando seu amor a Deus, chorando, gemendo, gritando… e a música ia se esvaindo devagar (sabíamos como criar um clima), iam sobrando apenas os sniff, sniff… Era uma sensação tão boa! Na verdade não desejava que aquilo acabasse ali, salvo quando estava atormentado pela culpa de algum pecado que me impedia de entrar naquele “mover” e, eu esperava que aquele lenga, lenga moroso terminasse o quanto antes!

É desta sensação de que me recordo agora… de forma nostálgica até! Sensação de Céu, de lá-fora-está-tudo-bem-obrigado, de não-me-preocupo-com-nada-porque-estou-”adorando”! E que me fazia desgostar tanto de ter que deixar aquele prédio sagrado para tornar à minha casa com minha mãe “descrente” e minhas irmãs “desviadas” e todo o “inferno” que vivia lá dentro. Claro, se minha referência de Céu era o culto, para mim o inferno era em casa: responsabilidade, relacionamento para cuidar, diálogo para administrar, tarefas para cumprir, problemas para superar, gente para amar, gente para odiar, gente para perdoar, falta de dinheiro para se preocupar… vida para viver! E sem abundância por sinal! Minha vontade era ficar recluso dentro da “i”greja, eu até tinha as chaves do templo! De maneira que para não ficar em casa, ficava lá dentro, ouvindo música, adorando, orando… FUGINDO!

Toda essa experiência religiosa era tão gostosa quanto ficar com as meninas (geralmente esse era o pecado de que devia me arrepender no fim de semana) ! Aqueles beijos sem compromisso que elevavam a adrenalina (geralmente tinham que ser escondidos), que me causavam momentos de prazer, de satisfação efêmera… e que me fazia ir atrás de mais meninas pra ficar! Eu era dependente daquilo tudo… porque era como um ópio para mim! Uma válvula de escape, tal como beijar descompromissadamente (e, como não podia passar disso até o casamento, também descarregava de outra forma, o que também era um pecado frequente nas confissões antes de “ministrar”), tal como usar uma droga para fugir dos meus problemas, era assim que me viciava na “i”greja!

Mas, como disse, não posso ser ingrato nem com os beijos, frutos de imaturidade, nem com a experimentação religiosa e relacionamento com Deus de outrora, frutos de ingenuidade! Foram experiências que me trouxeram aprendizado e sensações arrebatadoras… mas, que não posso mais desfrutar porque cresci… e aprendi que não posso fugir da vida e achar que estarei seguro no interior de um templo, no ócio de um culto ou no ativismo de um ministério!

Agora sei que a Presença de Deus se faz em mim em todo o tempo, e essa noção de Deus Comigo, me ajuda a distanciar o pecado com maior eficiência e autenticidade. Não fujo mais da vida… mas, recebo a proposta de Cristo que veio para que eu tenha vida – viva- em abundância. Isso significa não ceder aos caprichos, problemas e relacionamentos que ela traz e não fugir como um covarde que não tem em quem confiar seu destino. Cristo é comigo, a quem (que) temerei?

Enxergo agora que se o Reino de Deus se resume aos mimos que experimentamos num culto, o mundo estaria sem esperança! Sei que o Reino já se estabelece nas nossas vidas à partir do momento que acedemos que Cristo reine em nós, tornando-nos Sua moradia! E implantando o Seu Reino aqui na Terra para que, quando Ele regresse, seja como no Céu!

Hoje, não preciso experimentar beijinhos (ou amassos) escondidos com cada gatinha diferente por aí, tenho com quem me RELACIONAR em compromisso, confiança e fidelidade. Hoje não preciso me entorpecer num ambiente sagrado achando que estou me relacionando com Deus… e esperar uma semana para experimentar outra vez a mesma sensação! Não preciso de lugar, hora, dia, ou programação com gente para me RELACIONAR com Deus!

Nem só de sensações boas viverá o homem…”
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