A festa já começou. Agora em 2011, a maior igreja protestante do Brasil, a Assembleia de Deus, completa 100 anos. Embalados pelo fogo do Espírito Santo, os assembleianos ajudaram a fazer do Brasil uma potência evangélica através de grandes líderes, cruzadas memoráveis e também da gente simples que compõe grande parte da membresia. Foi nas reuniões de oração, nos círculos de senhoras e nos bancos da Escola Bíblica Dominical que o povo da Assembleia de Deus (AD) construiu uma trajetória de magníficos serviços ao Reino de Deus.
Apesar dessa história já ter sido contada inúmeras vezes e de várias maneiras, ainda permanece um hiato. Num país onde a memória não é preservada, há quem defenda que restam muitas coisas no passado da igreja a esclarecer melhor.
Uma dessas pessoas é o sociólogo Gedeon Freire de Alencar, crente assembleiano e diretor pedagógico do Instituto Cristão de Estudos Contemporâneos. Revisando o passado, ele transformou sua dissertação de mestrado no livro Assembleias de Deus – Origem, implantação e militância (1911 – 1946), recém-lançado pela Arte Editorial.
Na obra, Gedeon passa a limpo o período, levanta ideias polêmicas e faz acurada análise dos primeiros anos da igreja. Segundo seu livro, o surto de crescimento da AD acompanhou o processo de desenvolvimento e fatos históricos e econômicos do país. A crise da borracha, por exemplo. Quando os seringais da Amazônia perderam terreno ante a concorrência internacional, entre os anos 1915 e 1920, mais de 200 mil trabalhadores retornaram para suas cidades de origem – muitos dos quais já convertidos ao Evangelho através do ministério da AD. E levaram consigo a fé avivada para regiões como o Nordeste, o Sul e o Sudeste, que logo viam nascer templos da denominação.
“Se considerarmos as condições de transporte e comunicação da época, bem como a perseguição católica e os preconceitos contra negros e mulheres, é um milagre de Deus a igreja ter alcançado o país em duas décadas”, diz Gedeon. O livro também destaca um ponto obscuro: a importância de Frida Vingren, mulher do pioneiro sueco Gunnar Vingren, que implantou a igreja em Belém (PA) junto com o compatriota Daniel Berg.
A história da Assembleia de Deus no Brasil tem seus mitos?
GEDEON ALENCAR – Vários. Um exemplo claro é a surpresa que tiveram os primeiros missionários quando receberam a profecia que os mandava vir ao Brasil. A impressão que dá a quem lê a história é de que não sabiam para onde iam – talvez, o fim do mundo. E essa imagem não corresponde à história. Desde o século 19, já havia grupos suecos no Sul do país e também – veja só – em Belém. O então imperador Pedro II esteve na Suécia, por volta de 1880, e nos jornais suecos eram publicados diversos convites para virem ao Brasil. Portanto, os suecos conheciam, sim, nosso país. O que não invalida a profecia nem diminui, para mim, o altruísmo de Berg e Vingren. Apenas os humaniza.
O que mais o surpreendeu durante as pesquisas?
Minha versão – que não é inventada por mim ou tampouco é fruto de algum subjetivismo – é a importância da f, algo desconhecido e desconsiderado pelos historiadores oficiais da igreja. Qual jornal no mundo, na década de 1920, tinha uma mulher como redatora chefe? Ao ler e tabular os artigos do jornal Boa semente (1919-1929), precursor do Mensageiro da paz, percebi a presença de Frida e de outras companheiras na equipe. Convenhamos, era uma vanguarda na questão de gênero, coisa que nenhum movimento feminista teve em nenhum lugar do mundo.
Qual a maior contribuição da Assembleia de Deus ao Evangelho no Brasil?
Uma das mais evidentes é a renovação espiritual, típica do pentecostalismo assembleiano. Outro ponto de destaque é a valorização dos excluídos. Em qual igreja, nas primeiras décadas do século 20, um indivíduo pobre e semiletrado poderia pregar, ler a Bíblia, cantar, dirigir um conjunto, ter oportunidades? Ainda hoje, nas regiões mais periféricas, são essas igrejas que dão nome, dignidade e valor aos excluídos. Um verdadeiro trabalho de inserção social. As Assembleias de Deus são o mais importante segmento pentecostal do país, pelo tamanho e pela contribuição que já deu. O lastimável é que, atualmente, como é fragmentada e completamente estraçalhada por brigas de ministérios e caciques, perde muito de sua força. Lamento muito.
Fonte: Cristianismo Hoje
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Apesar dessa história já ter sido contada inúmeras vezes e de várias maneiras, ainda permanece um hiato. Num país onde a memória não é preservada, há quem defenda que restam muitas coisas no passado da igreja a esclarecer melhor.
Uma dessas pessoas é o sociólogo Gedeon Freire de Alencar, crente assembleiano e diretor pedagógico do Instituto Cristão de Estudos Contemporâneos. Revisando o passado, ele transformou sua dissertação de mestrado no livro Assembleias de Deus – Origem, implantação e militância (1911 – 1946), recém-lançado pela Arte Editorial.
Na obra, Gedeon passa a limpo o período, levanta ideias polêmicas e faz acurada análise dos primeiros anos da igreja. Segundo seu livro, o surto de crescimento da AD acompanhou o processo de desenvolvimento e fatos históricos e econômicos do país. A crise da borracha, por exemplo. Quando os seringais da Amazônia perderam terreno ante a concorrência internacional, entre os anos 1915 e 1920, mais de 200 mil trabalhadores retornaram para suas cidades de origem – muitos dos quais já convertidos ao Evangelho através do ministério da AD. E levaram consigo a fé avivada para regiões como o Nordeste, o Sul e o Sudeste, que logo viam nascer templos da denominação.
“Se considerarmos as condições de transporte e comunicação da época, bem como a perseguição católica e os preconceitos contra negros e mulheres, é um milagre de Deus a igreja ter alcançado o país em duas décadas”, diz Gedeon. O livro também destaca um ponto obscuro: a importância de Frida Vingren, mulher do pioneiro sueco Gunnar Vingren, que implantou a igreja em Belém (PA) junto com o compatriota Daniel Berg.
A história da Assembleia de Deus no Brasil tem seus mitos?
GEDEON ALENCAR – Vários. Um exemplo claro é a surpresa que tiveram os primeiros missionários quando receberam a profecia que os mandava vir ao Brasil. A impressão que dá a quem lê a história é de que não sabiam para onde iam – talvez, o fim do mundo. E essa imagem não corresponde à história. Desde o século 19, já havia grupos suecos no Sul do país e também – veja só – em Belém. O então imperador Pedro II esteve na Suécia, por volta de 1880, e nos jornais suecos eram publicados diversos convites para virem ao Brasil. Portanto, os suecos conheciam, sim, nosso país. O que não invalida a profecia nem diminui, para mim, o altruísmo de Berg e Vingren. Apenas os humaniza.
O que mais o surpreendeu durante as pesquisas?
Minha versão – que não é inventada por mim ou tampouco é fruto de algum subjetivismo – é a importância da f, algo desconhecido e desconsiderado pelos historiadores oficiais da igreja. Qual jornal no mundo, na década de 1920, tinha uma mulher como redatora chefe? Ao ler e tabular os artigos do jornal Boa semente (1919-1929), precursor do Mensageiro da paz, percebi a presença de Frida e de outras companheiras na equipe. Convenhamos, era uma vanguarda na questão de gênero, coisa que nenhum movimento feminista teve em nenhum lugar do mundo.
Qual a maior contribuição da Assembleia de Deus ao Evangelho no Brasil?
Uma das mais evidentes é a renovação espiritual, típica do pentecostalismo assembleiano. Outro ponto de destaque é a valorização dos excluídos. Em qual igreja, nas primeiras décadas do século 20, um indivíduo pobre e semiletrado poderia pregar, ler a Bíblia, cantar, dirigir um conjunto, ter oportunidades? Ainda hoje, nas regiões mais periféricas, são essas igrejas que dão nome, dignidade e valor aos excluídos. Um verdadeiro trabalho de inserção social. As Assembleias de Deus são o mais importante segmento pentecostal do país, pelo tamanho e pela contribuição que já deu. O lastimável é que, atualmente, como é fragmentada e completamente estraçalhada por brigas de ministérios e caciques, perde muito de sua força. Lamento muito.
Fonte: Cristianismo Hoje
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