terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Cuidado com o estelionato religioso

“Sabe, porém, isto: que nos últimos dias sobrevirão tempos trabalhosos.”
2 Tm 3:1


Ser cristão não é tarefa fácil em tempos difíceis ou trabalhosos, como afirma o Apóstolo Paulo no texto acima. A ética nunca esteve tão em voga como nos dias atuais e também é certo que nunca foi tão olvidada como nesta quadra da história universal.

Qual é o padrão ético para a conduta individual do cristão? Ora, o padrão ético-cristão, não decorre de uma declaração principiológica denominacional e nem mesmo de um conjunto de conceitos recomendáveis adotados por uma instituição ou denominação religiosa, ele deve resultar das recomendações de Cristo seguidas e vividas por seus apóstolos e demais seguidores exteriorizando-se na prática cotidiana dos cristãos.

Poderíamos dizer que a ética cristã tem correspondência estreita com as chamadas boas obras, pois para isso fomos chamados. Com efeito, Cristo deixa assentado no Sermão da Montanha: “Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai, que está nos céus.” Mt 5:16

Em contraposição, entre essa desejável situação, presenciamos um cristianismo em crise, pois os grupos religiosos que se dizem cristãos, em sua grande parte, estão sendo guiados por outros valores. Há um evangelho sendo pregado e que está fadado a incorrer nas normas previstas no Código de Defesa do Consumidor. A prédica desses grupos está centrada na teologia da prosperidade e que depende do indivíduo abrir a mão de recursos, doações significativas (carros, casas e etc) para, em contrapartida terem direito a uma série de retribuições materiais.

Essas igrejas (leia-se esses líderes religiosos) sabem como o ser humano é ambicioso, assim, estimulam a ambição de seus fiéis e simpatizantes fazendo campanhas publicitárias nas quais vendem pura ilusão. Quando o indivíduo percebe que foi enganado pela publicidade enganosa, o estelionato religioso já aconteceu. Muitas dessas querelas entre fiéis e organização religiosa, acabam desembocando no Judiciário e mesmo pessoas com certa experiência cristã acabam se proclamando vítimas.

Doar é algo lícito e presente na doutrina cristã, todavia, é necessário verificar que doação é, juridicamente falando, um ato unilateral de liberalidade no qual o doador abre mão de um valor patrimonial em favor do donatário (pessoa que a recebe). Os tribunais pátrios estão sendo exigidos a se manifestarem a respeito de inúmeros casos onde “doadores” pretendem a revogação de doações na qual a manifestação da vontade (o desejo de dar) foi obtida de forma viciada (ou seja, com a utilização de expediente que impediu que o ato de doar decorresse de uma decisão livre e consciente).

Essa prova nem sempre é possível, como no caso do julgado do TJSP em que os componentes da Câmara concluíram: “Neste passo, rejeita-se o argumento de que ao fazer a doação agiu em erro ou sob coação, como bem anotou o Desembargador Maia da Cunha, sendo certo, ainda, que como ponderado por Jacobina Rabello, não se trata de neófita em assuntos de fé.” (TJSP – Embargos infringentes n° 273 753-4/0-01 – São Paulo)

Richard J. Foster diz que o ato de doar “escandaliza o mundo do consumo e da competitividade; leva o dinheiro para a causa de Cristo.” Citando Jaques Ellul, Foster observa: “Temos indicações muito claras de que, na vida cristã, o dinheiro é ganho a fim de ser dado.” (Dinheiro, Sexo e Poder – Mundo Cristão, 2005, São Paulo).

Mas é necessário que aquele que faz doações a faça voluntariamente sem que haja pressão ou expedientes ardilosos, desenvolvidos justamente para arrancar bens e valores mediante promessas de uma vida abençoada e próspera, quando a doação deve ser feita tendo como único interesse ajudar e sem objetivo de retorno ou fazer negociata com Deus.

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