sábado, 9 de julho de 2011

Sudão pode ter radicalização islâmica após separação do Sul

A independência do Sudão do Sul, com população majoritariamente animista e cristã, pode acelerar a islamização do vizinho do norte, caso o regime de Cartum decida radicalizar a aplicação da sharia (lei islâmica), conforme se pode constatar dos rumos políticos do país.

A partir do próximo dia 9, quando for proclamada a independência do Sul, o norte do país conservará o nome "Sudão" e se transformará em um Estado de maioria árabe muçulmana, o que pode restringir os direitos dos cristãos que vivem no território.

A Constituição provisória elaborada em 2005, ao término da guerra civil entre o norte muçulmano e o sul cristão, reconhece a pluralidade étnica, cultural e religiosa, mas sua validade terminará em 9 de julho, com a previsão de que a lei máxima do país sofra modificações.

As declarações do presidente sudanês, Omar Hassan Ahmad al Bashir, após o referendo sobre a independência do Sul realizado em janeiro passado, não deixam lugar a dúvidas de que este reconhecimento à diversidade religiosa não será mantido.

Suas declarações após a consulta popular foram categóricas: "99% do povo do norte do Sudão é muçulmano. A Constituição atual será modificada e, então, não haverá forma de falar de uma pluralidade cultural e étnica (...). O islã será a religião oficial e o árabe a língua oficial".

O compromisso do líder de ampliar a aplicação da sharia no Sudão depois da separação do sul preocupou a minoria cristã que ainda vive no norte do país, parte da qual é procedente do sul.

Um engenheiro cristão, que preferiu manter anonimato, diz à Agência Efe que, antes do referendo, havia um equilíbrio entre muçulmanos e cristãos, mas que, depois da separação do sul, estes últimos se transformarão claramente em minoria.

Na opinião da Igreja Copta sudanesa, a situação dos cristãos não vai mudar substancialmente, pois eles já viveram anos sob a sharia, desde que ela começou a ser aplicada em 1983, durante o mandato do então presidente Gaafar Nimeiry.

"Não achamos que a sharia será aplicada de uma maneira que prejudique os não muçulmanos", destaca à Efe o bispo da Igreja Copta em Cartum, Elía.

No entanto, alguns cristãos têm medo e se queixam da discriminação perante a maioria muçulmana, sobretudo devido ao limitado número de igrejas cristãs que se constroem no país.

O ministro de Assuntos Religiosos sudanês, Azhari al Tigani, consideram sem cabimento os temores relacionados à reconciliação religiosa no Sudão, após a independência do Sul.

Em recentes declarações à imprensa, Tigani disse que não há motivo para preocupações sobre a situação dos cristãos no norte do país depois da separação do Sul.

O ministro destacou que, ao longo da história do Sudão, não se praticou nenhum tipo de pressão contra os cristãos. Para ele, isso se mostra patente diante da variedade de igrejas, nem todas do Sul, mas também coptas e outras pertencentes às comunidades de regiões do Nilo Azul e Núbia.

No entanto, prevalece um certo temor, também porque a comissão encarregada de proteger os direitos dos não muçulmanos em Cartum - criada após a assinatura do acordo de paz em 2005 - será dissolvida na semana que vem após a independência do Sul.

Diante das mudanças que devem afetar o país, vários grupos de cristãos, como os coptas, pediram que a comissão mantenha suas funções para proteger os direitos da minoria religiosa e garantir que a sharia não seja aplicada a eles também.

Para o professor de Ciências Políticas Al Tayyip Zein al Abedin, da Universidade de Cartum, o regime que baseia sua legitimidade na sharia "busca novos slogans" nesses tempos difíceis. Ele explica à Efe que o discurso político dos dirigentes sudaneses "é uma mera reação convulsa à independência".

"Mesmo que a Constituição seja reformada, nada vai mudar na prática", exclama o professor, já que, em sua opinião, embora a Carta Magna atual enfatize o respeito da sharia no norte do país, isso não se aplica.

Difere desta informação o caso de várias mulheres que, em 2009, foram punidas com chicotadas por vestirem calças e por não cobrirem o cabelo com o tradicional véu islâmico.

Mude ou não a situação das minorias no país, seja ou não aplicada com mais rigidez a sharia, o que fica evidente é que a independência do Sudão do Sul, onde a maioria da população é cristã e animista, porá fim à pluralidade religiosa que até agora caracterizava o país.


Fonte: EFE
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