quarta-feira, 19 de agosto de 2009

G12, cadê você? Quando a visão de homens se torna visão de Deus

“E, perseverando unânimes todos os dias no templo, e partindo o pão em casa, comiam juntos com alegria e singeleza de coração, louvando a Deus, e caindo na graça de todo o povo. E todos os dias acrescentava o Senhor à igreja aqueles que se haviam de salvar.” At 2.46-47

“Deus não é homem, para que minta; nem filho do homem, para que se arrependa; porventura diria ele, e não o faria? Ou falaria, e não o confirmaria?” – Nm 23.19

Entreguei minha vida a Cristo há 7 anos, e nessa época estava em evidência o movimento Grupo dos 12, ou G12. Estava começando a ser implantado na igreja em que comecei a congregar e na qual fui batizada, a Igreja do Evangelho Quadrangular, uma igreja do ramo pentecostal que possui uma história muito bonita aqui no Brasil, tendo iniciado a evangelização com cruzadas onde usavam tendas de circo para abrigar os cultos.

Naquela época, era o Espírito Santo quem acrescentava as almas que seriam salvas. Os missionários americanos vinham, trabalhavam duro, e num país predominantemente católico conseguiam encher as tendas nas cidades em que passavam, levando simplesmente a Palavra de amor de Cristo.

Porém o tempo passa, as tendas deram lugar aos prédios de alvenaria, formaram-se pastores e obreiros, e percebeu-se que, por algum motivo, os templos de pedras não ficavam tão cheios quanto desejavam seus líderes. E aí apareceu a “visão de Deus”, segundo o profeta Castellanos, da Colômbia: a partir da igreja em células de Paul Yong Cho, Castellanos teria recebido de Deus a visão de que deveria dividir a igreja em grupos onde cada um discipularia 12 pessoas, numa espécie de pirâmide: o pastor teria seus 12, que teriam seus 12, que teriam seus 12, assim abarcando toda a igreja e tornando a todos líderes. Na igreja do Castellanos o objetivo de crescimento foi conquistado, pois ao que parece são mega-templos com milhares de fiéis. Porém, no Brasil não foi bem assim.

Contarei minha experiência pessoal com esse movimento. Recém-chegada na igreja, cheia de dúvidas, de temor e de esperanças, fui muito bem acolhida pelo pastor da IEQ da Aclimação, em São Paulo. Para mim, um exemplo de pastor, daqueles que têm cheiro de ovelha de verdade. A igreja estava em seu início, poucos membros (na carteirinha de membro que guardo até hoje com muito carinho era a número 31), mas muito amor pelas almas. A IEQ da Aclimação estava sob a supervisão (acho que é isso) da IEQ do Ipiranga, e lá estavam implantando o G12, e da mesma forma a visão foi passada para a nossa igreja. O pastor estava muito animado, comprou mesmo a visão como sendo de Deus, todos fomos enviados ao “encontro”, ao pré e ao pós, formamos grupos de 12, e aí começaram os problemas.

1a. inverdade do G12: todo o mundo nasceu para ser líder.

Se Deus tivesse criado todo o mundo para a liderança, quem seria servo? Quem iria trabalhar, se todos fossem mandar? Quem ouviria a pregação, se todos ficassem falando no púlpito?
Pela visão de Castellanos, que dizia ser de Deus, todos eram líderes em potencial, e como tal necessitavam apenas ser treinados. Tinha até uma ordem de treinamento: ganhar, consolidar, discipular e enviar. O “enviar” seria o novo líder formar seu próprio grupo de 12 pessoas. Em minha experiência, eu e as pessoas que faziam parte do mesmo grupo não conseguimos ser discipuladas, pois não víamos autoridade na pessoa que foi posta por nossa líder. Embora cheia de boa-vontade, de amor pelas almas, de amor pela tal visão, a discipuladora ainda não estava preparada para liderar, o que ocasionou no desastre do nosso pequeno grupo. De certo modo ainda bem, pois se desse certo, o desastre seria ainda maior na frente, pois no meu grupo havia pessoas que tremiam só de pensar que, um dia, teriam que forçosamente liderar, mesmo sem capacitação para isso.

2a. inverdade do G12: todo o mundo nasceu para ser pastor.

Se ser líder já é um privilégio de poucos, ser pastor é um privilégio de menos ainda. Para ser pastor, é necessário ser líder, ser psicólogo, ser enfermeiro, ser pai e ser professor, sem contudo ter feito todas essas faculdades. O pastor tem que ter amor tal, a ponto de dar a vida por suas ovelhas. Tem que ter grande sabedoria, para aconselhar e exortar na medida certa. Precisa saber ministrar os remédios da alma, e ter disposição para estar presente quando necessário. Simplesmente não é para qualquer um.
No G12, o pastor da igreja deu lugar ao pastoreio da nossa discipuladora. Mesmo com toda a boa intenção, ela ainda não era pastora. Até abríamos nossos problemas perante o grupo, conforme a instrução do G12, mas isso trouxe alguns problemas, pois nem todos são confiáveis, mesmo que congregando numa igreja. Sentíamo-nos, lá no fundo, como ovelhas sem pastor, embora não pudessémos pensar assim por causa da próxima inverdade.

3a. inverdade do G12: a visão é de Deus, não pode ser criticada.

Segundo o Castellanos, a visão do G12 vinha diretamente do Trono de Deus e não podia ser contestada, e quem não aderisse à tal visão ficaria de fora do grande avivamento que ela traria. Desse modo, não podíamos fazer críticas, ou mesmo ousar pensar em criticar, pois estaríamos em rebelião. Uma frase do amável pastor local diz tudo:

“Quem não está na visão está fora, é melhor deixar a igreja”.

Isso ele disse num culto, e não era frase dele não. O pastor apenas replicava um ensinamento do G12, que é o ensinamento de qualquer seita: a não aceitação de críticas. É engraçado, pois a tal “visão de Deus” ia contra os ensinamentos bíblicos, onde Deus em muitas ocasiões se permite, e até incentiva, que o provemos. Temos que provar se os espíritos são de Deus, temos que ser bereanos e provar se os ensinos estão mesmo nas Escrituras, mas não podemos provar o G12. Se não gostamos da tal visão, que deixemos a igreja simplesmente. E foi o que, meses depois, eu e meu marido fizemos.

Existem muitas outras inverdades girando em torno do G12, como as heresias que ocorriam nos tais encontros e das quais sou testemunha, mas já existe muita literatura na própria internet sobre o assunto. O fato é que a tal “visão de Deus”, implantada em grande parte das igrejas quadrangulares e em outras denominações também, mostrou-se um instrumento demoníaco, a ponto de dividir igrejas e ministérios. A IEQ da Aclimação hoje conta com pouquíssimos membros, nenhum daquela época, Nos cultos vão umas 10, 15 pessoas no máximo. A IEQ do Ipiranga está muito linda, foi feita uma reforma na época áurea do G12 por lá, porém lota cerca de um terço de sua capacidade nos cultos de domingo, pois o pastor anterior, adepto do G12, não aceitou deixar o movimento, tornou-se “apóstolo” e abriu outra denominação na mesma região, levando consigo boa parte dos fiéis. De dois cultos aos domingos lotados, hoje na IEQ Ipiranga frequentam o culto de domingo umas 40, 50 pessoas quando muito.

Isso é o que eu vi, acho que muitos têm suas próprias más experiências com o G12. A própria liderança do G12 nacional se dividiu, com o Ap. Terra Nova criando seu próprio grupo, o Mir12. Soube de igrejas que também criaram seus próprios modelos de crescimento, como o M7 de um outro ministério, e outros mais.

A Palavra diz que se conhece a árvore por seus frutos. Através disso podemos ver que a tal “visão de Deus” não tinha nada de divina, embora seu propósito inicial, o de salvar o maior número de almas possível, pudesse parecer bastante louvável. Ocorre que a própria Palavra diz que poucos serão os salvos, então crer que é possível salvar todo o Brasil ou o mundo através de uma estratégia de crescimento é utopia. Como no tempo dos apóstolos, quem acrescenta até hoje as almas que serão salvas é o Espírito Santo, ninguém mais. Como pastores, podemos estudar, pregar, evangelizar, ficar 24 horas nas ruas buscando as pessoas, mas quem faz a obra é o Espírito Santo. Nossos esforços humanos são vãos sem Deus.

E só Deus conhece verdadeiramente nossos corações. Será que, por detrás do belo desejo de que muitos sejam salvos não está escondido o desejo de que nossa denominação seja a maior e a mais rica e poderosa? Será que lutaríamos pela salvação com o mesmo vigor, se fosse para as pessoas se tornarem membros de outras denominações? Muito provavelmente não, infelizmente.
Dia 18 de junho farei 7 anos como convertida a Cristo.

Sinto, com tristeza, que exceto meu marido não terei ninguém daquela época para comemorar comigo, pois graças à visão nada de Deus do G12 todos estão espalhados, uns congregando em outras igrejas, outros talvez desviados. Mas a Deus seja a glória, Ele é o pastor que ajunta as ovelhas.
Fonte: http://estrangeira.wordpress.com/